ENTENDENDO O DIREITO 73 – DA EDUCAÇÃO

Da Educação
Autoria de Geovanna Santos
RESUMO
A Educação tem sido tema de diversas discussões na atualidade, este artigo é um estudo, tendo como objetivo principal mostrar, de forma clara e com linguagem simples, para a sociedade a importância da educação na formação do ser humano confirmando que o acesso à educação é um direito básico e fundamental do cidadão brasileiro por meio de legislações internacionais e nacionais sobre o tema e aborda como nova organização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que abrange três etapas: educação infantil, ensino fundamental obrigatório e ensino médio, progressivamente obrigatório. Tais etapas são constituídas de uma realidade única, diversa e progressiva, com a competência dividida entre os entes federativos da República Federativa do Brasil. A metodologia utilizada para o alargamento da pesquisa foi a pesquisa bibliográfica, onde foi realizado um levantamento e análise de trabalhos já publicados sobre o tema, análise de dados de pesquisas e análise de obras literárias com o intuito de extrair o máximo de informações possíveis para a escrita de tal artigo que tem como finalidade tornar o acesso ao Direito mais fácil para o cidadão.
Palavras-chave: Educação, Direito, Cidadão, Obrigações do Estado, Dever, Princípios.
A educação como base na formação do ser humano
Educação é o ato de educar, de instruir, é a disciplina. Em seu sentido mais abrangente, educação são os hábitos e valores de uma comunidade, transferidos para as futuras gerações e existe na família, na comunidade, na escola. Pensar na educação implica compreender que ela está presente em todas as partes da vida cotidiana, da ação mais simples, a mais complexa. À vista disso, a escola não é o único espaço de aprendizagem, mas é essencial na vida do indivíduo.
Segundo Antunes (2010, p. 9), “a Educação Infantil é tudo; o resto, quase nada”. Essa frase é indiscutivelmente verdadeira, pois a infância é um período privilegiado durante a vida para o desenvolvimento de brincadeiras diversas, entretanto, o que a minoria das pessoas leva em conta é o fato de uma “brincadeirinha” ser essencial na vida da criança, uma vez que auxilia no seu desenvolvimento de seguir regras, respeitar os colegas, entre outras lições que podem ser tiradas. Os pequenos, como seres ativos, podem se tornar cada vez mais competentes para lidar com as coisas do mundo, se tiverem oportunidades para se desenvolver com essas brincadeiras.
A Educação Infantil tem papel fundamental na formação do ser humano que se expressa no objetivo de promover o desenvolvimento integral da criança, nos aspectos: físico, psicológico, intelectual e social. Por isso foi instituída na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) como a primeira etapa da Educação Básica, voltada para o atendimento de crianças de 0 a 6 anos incompletos. Conforme proposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2010), as instituições de ensino são orientadas segundo um trabalho pedagógico consistente, visando valorizar as características das crianças enquanto sujeitos de diretos, buscando desenvolver nelas a autonomia, valores, identidade, criticidade, liberdade, em sua cartilha existem três princípios que devem ser respeitadas pelas propostas pedagógicas da Educação Infantil:
Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades.
Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática.
Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais. (BRASIL, 2010, p. 16).
Princípios esses que devem ser vivenciados na instituição, no cotidiano das atividades com as crianças. O princípio ético, que diz respeito ao desenvolvimento de atitudes de autonomia e de responsabilidade por parte das crianças, e discute sobre regras, a responsabilidade de cada um para o funcionamento do coletivo da instituição, entre outras questões, pode ter como exemplo a responsabilidade com o chegar na escola antes do horário em que se inicia a aula. O princípio político, diz respeito a cidadania e o desenvolvimento da criticidade nas crianças, o simples ato de participar de uma atividade em grupo com os colegas e as situações cotidianas possibilita ampliar sua visão de mundo sobre temas que lhes dizem respeito como tomar decisões, o que contribui para o desenvolvimento do senso crítico, a vivência democrática, o exercício da cidadania. E o princípio estético orienta sobre aspectos quanto a criatividade, a sensibilidade, a ludicidade e a liberdade de expressão, a forma individual de cada um se manifestar no mundo, com base nesses princípios é possível observar que a educação tem um papel fundamental na formação do cidadão e na transformação da sociedade.
O papel da instituição de ensino não é só propiciar o conhecimento intelectual que faz parte de sua grade curricular, matérias previstas a serem dadas. Sua função vai além, cabe-lhe preparar os jovens para o futuro e, se a pretensão é transformar a sociedade para um futuro mais justo e igualitário, é necessário preparar os educandos para tal, para que não seja apenas um cidadão de papel, pessoa que concorda com o sendo comum, mas que saiba ser cidadão de fato e de direito, em todo tempo e lugar. Ser cidadão não é apenas possuir um documento de registro, não é só exercer o direito do voto, mas é ter participação ativa na sociedade, é reclamar quando um direito não é respeitado, é ter educação de qualidade, é ter atendimento médico quando necessário, é ver garantido seus direitos e é também conhecer os deveres inerentes a cada direito.
Cada minuto do aluno na escola deve conduzi-lo para a formação de um cidadão crítico, responsável e transformador. O professor deve possuir uma qualificação profissional que lhe dê condições de orientar à nova geração, mas a intenção é ir além do conhecimento intelectual que proporciona ao aluno ferramentas para sua atuação profissional e que seja um ser humano convicto de sua responsabilidade perante a sociedade. A escola é um local privilegiado para o exercício da cidadania, é aí que se formam as bases para a atuação futura na sociedade.
A educação infantil sendo a primeira etapa da educação básica é dividida em duas partes sendo elas a creche e a pré-escola, tem como finalidade o desenvolvimento da criança de até 5 anos. Após essa etapa, vai para o ensino fundamental obrigatório, que tem a duração de 9 anos, sendo gratuito na escola pública e se inicia aos 6 anos de idade e tem como objetivo a formação básica do cidadão. E na etapa final da educação básica passa pelo ensino médio, que tem duração mínima de 3 anos.
A educação superior se situa no nível de ensino acima da educação básica, estrutura antes estabelecida como 3º grau, e tem como finalidades estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo; formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento; incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica; promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação; suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional; estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, prestando serviços especializados à comunidade e estabelecendo com esta uma relação de reciprocidade; promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.
De acordo com o Decreto 5.773/2006, art. 12 as instituições de ensino superior são limitadas e determinadas:
Art. 12. As instituições de educação superior, de acordo com sua organização e respectivas prerrogativas acadêmicas, serão credenciadas como:
I – Faculdades;
II – Centros universitários; e
III – universidades.
No caso do sistema federal de ensino, a rede federal de educação profissional, científica e tecnológica compreende, ainda, os institutos federais, as universidades tecnológicas e os centros federais de educação tecnológica. Nas instituições de educação superior responsáveis pelo ensino, os cursos e programas oferecidos podem ser: i) sequenciais, por campo de saber, de diferentes níveis de abrangência, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio; ii) de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio e classificados em processo seletivo; iii) de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, os cursos de especialização e aperfeiçoamento, abertos a candidatos que possuam curso de graduação e atendam as demais exigências das instituições de ensino; iv) de extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos por cada instituição de ensino.
Direito à educação
- Direito à educação no âmbito internacional
Podemos dizer que a Educação é o processo de humanização que ocorre na sociedade, permitindo que os indivíduos participem do processo civilizatório, se desenvolvam e tenham oportunidades que só o estudo consegue oferecer. A educação é reconhecida no âmbito internacional como um direito humano, positivado constitucionalmente no âmbito nacional, vinculado aos ideais da democracia, da Justiça Social, da igualdade e o do trabalho. A Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH), de 1948, partiu do pressuposto de que somente através do “ensino e da educação” será possível a promoção do respeito aos direitos e liberdade proclamados por ela:
A Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.
A da educação estando presente nos parágrafos iniciais da DUDH é citada também em outros artigos da declaração, observado o se artigo 26° que diz o seguinte:
Artigo 26. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito.
O artigo da DUDH torna obrigatória uma educação primária e gratuita para todos. Independentemente de idade, a pessoa pode, e deve, ter acesso à educação e à alfabetização. Tratar dos Direitos Humanos não é meramente defender os direitos individuais, mas também buscar a defesa dos direitos da sociedade como um todo, é olhar de maneira igualitária para todos os cidadãos e querer oferecer oportunidades iguais para todos.
A DUDH sendo um documento escrito há mais de 50 anos, passa por atualizações intermédio da elaboração de novos instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, tais como o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, aprovados pela Assembleia Geral da ONU em 16 de dezembro de 1966. O especial destaque deve ser dado ao art. 13 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
“Artigo 13. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à educação. Concordam em que a educação deverá visar ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido de sua dignidade e fortalecer o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais. Concordam ainda em que a educação deverá capacitar todas as pessoas a participar efetivamente de uma sociedade livre, favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e entre todos os grupos raciais, étnicos ou religiosos e promover as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz”.
O acordo diz que seus membros devem trabalhar para a concessão de direitos à educação, visando o pleno desenvolvimento da personalidade humana, vinculando-o como parâmetro para estabelecer a dignidade, as liberdades fundamentais, a participação na sociedade livre, tolerância, paz entre as nações, inclusão social e a paz.
- Direito à educação no Brasil
A educação tem função social por ser um processo que abrange as relações sociais em sua extensão máxima e de forma contínua. É nesse sentido que a Dignidade da Pessoa Humana e a Cidadania se posicionam na Constituição Federal de 1988 dentre os cinco fundamentos para a estruturação de um Estado Democrático de Direito:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
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- a soberania;
- a cidadania;
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III. a dignidade da pessoa humana;
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- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
- o pluralismo político.
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Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Tais fundamentos são necessários para entender o que é cidadania que compreende todos os direitos e obrigações de natureza política. Outro fundamento é a dignidade humana é um princípio difícil de se definir exatamente, o interessante nele é que, apesar de ser difícil de definir, é muito fácil identificar sua violação, ela inclui as mais diversas faces da liberdade, do trabalho, da política, da integridade, entre outros, além de como esses valores se relacionam.
Diante disso, emerge a necessidade de garantir o desenvolvimento da cidadania e a dignidade da pessoa humana, e com esse intuito o Art. 6 foi criado para tratar dos direitos sociais, sendo a educação um direito de todo o cidadão brasileiro, artigo que está presente na Constituição Federal da República de 1988 (CF/88), a Carta Magna do país, e deve ser tida como normativa e o ordenamento jurídico pátrio que tem diversos artigos que tratam sobre a educação, o que revela sua essencialidade:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (…)
Da leitura do artigo, infere-se que a CF/88 identifica à educação como um direito fundamental de natureza social e determina que o direito à educação não é somente a garantia do acesso e a permanência no ensino básico, mas também, a garantia de um padrão de qualidade para todos.
Para Alexandre de Morais, os direitos sociais são liberdades positivas e direitos fundamentais do homem. Para o doutrinador, o Estado Social de Direito deve observá-los obrigatoriamente e a principal finalidade de tais direitos é a melhor condição de vida do cidadão, em especial os hipossuficientes, objetivando a igualdade social (MORAES, Alexandre). Ao ser garantido na CF/88 o Estado assume uma obrigação que lhe é imposta e deve ser garantida com um padrão de qualidade para todos, essa obrigação além de ser do Estado também é da família:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
No art. 205, a Constituição especifica referido direito, estabelecendo que deve visar ao “pleno desenvolvimento da pessoa”, “seu preparo para o exercício da cidadania” e a sua “qualificação para o trabalho”. Esses objetivos expressam o sentido que a Constituição concedeu ao direito fundamental à educação. Isso significa que o direito à educação é o direito de acesso, mas não um acesso a qualquer educação, e sim àquela que atende às preocupações constitucionais. O artigo tem o objetivo de guiar a sociedade e o Estado acerca dos deveres e do papel de cada um com relação à educação. Destaca que o incentivo deve advir da família e da sociedade em geral, sendo uma obrigação do Estado fornecer os insumos necessários para que todos tenham acesso ao ensino de qualidade e qualificação profissional.
Além de fazer parte da legislação mais importante do país, existem ainda duas leis que regulamentam e complementam a do direito à Educação: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Juntas, essas três legislações possibilitam o acesso fundamental de todos os cidadãos brasileiros à escola pública, permitindo que nenhuma criança, jovem ou adulto deixe de iniciar ou completar os seus estudos por falta de vaga. O ECA, sendo uma legislação especial para crianças e adolescentes, tem por destaque os seguintes artigos:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Art. 53. Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.
Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.
A educação é um dever do Estado e da família e está diretamente ligada ao pleno exercício de cidadania e ao princípio da dignidade humana, uma vez que ao ter acesso ao conteúdo ministrado na escola tem o seu conhecimento ampliado, o que contribui para o desenvolvimento e consequentemente traz melhorias para a vida do indivíduo, de tal forma que terá acesso a oportunidades de melhores condições de vida para ele e toda sua família.
Princípios informadores do ensino
O texto do 6° artigo da Constituição Federal de 1988, a “Constituição Cidadã”, estabelece a educação como o primeiro dos direitos sociais, reafirmando o dever do Estado para com a educação e determinando a gratuidade do ensino público para a educação básica, ampliando para o ensino médio e declarando, explicitamente, o princípio da gratuidade do ensino público, não sendo aceito a cobrança de mensalidade em instituições públicas de ensino. Ou seja, onde há uma instituição de ensino privado, é obrigação do Estado garantir que haja uma instituição pública para que todos tenham pleno acesso ao ensino básico. Mas essas instituições têm conteúdo e princípios a serem seguidos. Esses princípios são encontrados na mesma legislação, tendo para si um capítulo exclusivo com o seguinte título “Da Educação, da Cultura e do Desporto. Os princípios são explicitados no artigo 206, da Carta Magna, configuram o que norteia todo o sistema de ensino brasileiro:
No artigo 206 do texto constitucional, assenta-se que o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I. igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II. liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III. pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV. gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V. valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;
VI. gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII. garantia de padrão de qualidade;
VIII.piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.
Como é possível notar, a Carta de 1988 garantiu um olhar diferenciado para a educação em relação às legislações predecessoras, preocupando-se não apenas com a oferta, mas com as condições desta oferta e a sua qualidade. Outro ponto trazido nesse artigo diz respeito à oferta de atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência e ao ensino noturno regular, adequado às condições do educando — fatores que reiteram a preocupação com a ampliação do entendimento sobre quem são os sujeitos que têm direito à educação, o que traz a educação de inclusão, o dever que se tem com a sociedade para torná-la mais igualitária,
O artigo traz o princípio da igualdade de condições para acesso e permanência na escola constituir uma diretriz fundamental que significa que todos têm direito de ingressar na escola, sem distinção de qualquer natureza, não podendo ser obstada a permanência de quem deve acesso. Atrelado a permanência na escola, está a igualdade de condições, o ensino, além de seguir a grade curricular proposta pelo governo, deve ser de qualidade, mantendo um padrão para todo e qualquer aluno. Além dos aspectos pedagógicos, é essencial fornecer também condições de infraestrutura, transporte escolar gratuito, merenda, valorização e formação continuada dos profissionais da educação.
A educação no Brasil é dividida em 3 partes: a educação infantil, ensino fundamental e médio e a educação superior, tendo como base o art. 208 da Constituição Federal:
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I – Educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;
II – Progressiva universalização do ensino médio gratuito; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996)
III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – Educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
V – Acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – Oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII – atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)
1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.
3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.
O artigo acima faz referência a estruturação da educação no país, trazendo por si só uma base do que deve ser seguido, qual a faixa etária de cada ensino, repetindo o fato do acesso ao ensino ser obrigatório e gratuito para todos. A novidade é o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, a LBD, em seu art. 4° estende aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e modalidades, preferencialmente na rede regular de ensino. O ensino noturno também é um direito, haja vista que o Brasil ainda é um país com grande desigualdade e muitos cidadãos trabalham para ter uma renda mensal e o único horário disponível para estudar é no período noturno. O que se pretende com todos esses direitos é o maior número possível de jovens, crianças e adolescentes nas salas de ensino, oferecendo oportunidade que atenda a todos eles independente de sua classe social, lugar onde mora e outras condições que são individuais.
Competência dos entes federativos
A República Federativa do Brasil é composta pela junção indissolúvel da União Federal mais os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios, são os chamados Entes Federativos, nos termos do artigo primeiro da Constituição Federal de 1988.
A Constituição Federal de 1988 definiu a base do Estado federativo brasileiro a partir de uma estrutura cooperativa de repartição de competências, em que, relativamente ao aspecto jurídico-político, coexistem competências exclusivas, privativas, concorrentes e comuns entre os entes federados, tanto nos aspectos legislativos, quanto nos aspectos administrativos, as chamadas competências materiais. Trata-se de uma estrutura complexa de repartição de competências, na medida em que o pacto federativo brasileiro se aproxima do modelo alemão, mas preserva as técnicas de repartição de competências típicas do federalismo norte-americano, em que se estabelecem competências fixas e reduzidas à União, sendo o restante das competências distribuídas às unidades subnacionais.
Competência deriva do latim compententia, de competere, significando estar no gozo ou uso de, ser capaz, pertencer ou ser próprio. Juridicamente, significa a capacidade de a autoridade possuir certas atribuições, a fim de deliberar a seu respeito. Assim, quando falamos em competências legislativas, falamos no poder que se confere a um determinado ente federado, para legislar sobre determinados assuntos para os quais ficam traçados os limites em relação às matérias. Competências são modalidades de poder das quais se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções. Dividem-se em legislativa e administrativa, em que a competência legislativa é a capacidade de estabelecer normas gerais e leis em sentido estrito. A competência administrativa (ou material) cuida da atuação concreta do ente, ou seja, dos atos administrativos.
Em relação às competências privativas, em matéria educacional, o artigo 22 em seu inciso XXIV, estabeleceu que cabe à União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional. Trata-se de um exemplo em que é competência da União baixar normas gerais, em assuntos de competência concorrente (REIS, 2000).
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XXIV – diretrizes e bases da educação nacional;
No que se refere à competência dos entes federados para com os sistemas educacionais, a Constituição Federal de 1988 instituiu no seu art. 211, que, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão organizar em regime de colaboração, seus sistemas de ensino.
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;
2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.
3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.
4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de forma a assegurar a universalização, a qualidade e a equidade do ensino obrigatório.
5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.
6º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão ação redistributiva em relação a suas escolas.
7º O padrão mínimo de qualidade de que trata o § 1º deste artigo considerará as condições adequadas de oferta e terá como referência o Custo Aluno Qualidade (CAQ), pactuados em regime de colaboração na forma disposta em lei complementar, conforme o parágrafo único do art. 23 desta Constituição.
O conteúdo desses parágrafos evidencia uma preocupação do legislador em estabelecer as competências que deverão ser assumidas pelos entes federados na constituição dos seus sistemas de ensino, definiu competências colaborativas e prioritárias dos entes federados quanto à oferta, organização e manutenção da educação pública. Em razão de a Constituição Federal não ter indicado nenhum nível de ensino para a atuação prioritária da União, reforça-se a sua ação supletiva e redistributiva em todos os níveis. Considerando-se o amplo escopo desta atribuição (todos os níveis de ensino), fica claro que à União compete oferecer o ensino superior à ausência do seu oferecimento pelas demais esferas de governos. Como estas devem ocupar-se prioritariamente da educação básica, a competência da União, em relação ao ensino superior, é residual. Vale lembrar que, no Brasil, tradicionalmente, o governo federal se ocupou com o seu oferecimento. A responsabilidade pelo oferecimento de ensino superior tem caráter supletivo e residual para a União, não sendo estimulado o seu oferecimento por Estados e Municípios. Dessa estrutura de repartição de competências, resultou a organização de três sistemas de ensino (federal, estadual/distrital e municipal), tendo cada ente federado autonomia e interdependência para a organização de seus sistemas.
Especificamente quanto a execução, o artigo 211 expressamente discorre sobre a organização dos sistemas de ensino em regime de colaboração e, ao versar sobre a atuação de Estados e Municípios optou por uma autorização genérica segundo a qual, caso implementado o sistema de ensino municipal, que atue “prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil) e, em relação aos Estados, caso estabeleça seu sistema de ensino, que atue “prioritariamente no ensino fundamental e médio”
Cabe aos Municípios e Estados executarem os encargos da educação básica, mas não legislar sobre tais matérias, a não ser no diz respeito aos encargos próprios de seu sistema de ensino (pessoal, gestão, financiamento e administração), exceção feita ao piso salarial do ensino básico.
Nas duas últimas décadas, o Ministério da Educação vem diversificando e aperfeiçoando os mecanismos de interferência nos sistemas estadual e municipal de ensino. Amparado legalmente por sua função de coordenação da política nacional de educação e de assistência técnica e financeira aos Estados e Municípios, o MEC, desde 1996, tem desempenhado importante papel como indutor de um modelo de gestão da educação e, portanto, de uma determinada política educacional, em todo o território nacional. Ressalta-se que esse processo vem sendo feito por meio de decretos, resoluções, pareceres e, principalmente, por um conjunto de programas destinados à assistência técnica e financeira do MEC aos Estados e Municípios, iniciados ainda no governo Fernando Henrique Cardoso.
A partir de 2007, esses programas foram reestruturados e novos foram implantados, passando a compor o PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação, tendo como mecanismos básicos: o (IDEB) – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, o plano de metas Compromisso Todos pela Educação e o (PAR) – Plano de Ações Articuladas. Com a nova estrutura, o apoio técnico e financeiro do Ministério da Educação aos entes federados ficou condicionado à adesão dos mesmos ao plano de metas Compromisso Todos pela Educação e à elaboração do PAR – um modelo de planejamento da política de educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para um período de quatro anos, previamente estruturado com base em um roteiro de ações e indicadores definidos pelo MEC. Assim, observa-se que a assistência técnica e financeira da União é acompanhada, de forma mais sistemática, de um processo de indução das ações da política educacional, instituindo uma espécie de descentralização administrada por uma instância central.
Simplificando aquilo que foi dito acima, cabe à União, exclusivamente, “elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social” (CR/88, art. 21, inciso IX). Ademais, a União intervirá nos Estados e no Distrito Federal para assegurar o cumprimento do princípio constitucional de aplicação do mínimo exigido da receita de impostos estaduais, inclusive de transferências tributárias, na manutenção e no desenvolvimento do ensino (CR/88, art. 34, inciso VII, alínea “e”). Organizará, ainda e em regime de colaboração, os sistemas de ensino, financiando as instituições de educação públicas federais e exercendo, “em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos” outros entes federados (CR/88, art. 211 e seu § 1º). Além disso, “aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito (por cento) […] da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino” (CR/88, art. 212). Por fim, garantirá o padrão mínimo de qualidade (CR/88, art. 206, inciso VII), em todos os níveis e categorias administrativas, procedendo à autorização e avaliação qualitativa na iniciativa privada (CR/88, art. 209, inciso II).
No modelo de repartição de competências educacionais adotado no Brasil, os encargos relativos à educação básica foram atribuídos a Estados, Distrito Federal e Municípios, nos níveis preferenciais indicados pela Constituição, mediante combinação de competências privativas à União e concorrentes aos demais entes, e aplicação vinculada de recursos.
CONCLUSÃO
O direito à educação é um direito prioritário, mas não é direito a uma educação qualquer: é direito a uma educação com qualidade. Na verdade, educação e “direito à educação” não são a mesma coisa. A educação é necessária, mas nem toda a educação é legítima, como foi discutido no artigo, visto que a Constituição Federal determina quais locais tem capacidade para o ensino. Educação houve sempre, direito à educação, como direito universal do ser humano, só há depois da Declaração Universal dos Direitos do Homem. O “direito à educação” é um direito do homem, isto é, tem uma significação ética. A ética do direito à educação é uma ética do interesse superior do educando, que não pode ser tratado e instrumentalizado como “objeto” de educação, mas deve ser considerado e respeitado sempre como “sujeito” do seu direito à educação. O direito à educação não é um direito dos pais sobre os filhos, nem do Estado sobre os cidadãos. É um direito dos filhos e dos cidadãos às responsabilidades dos pais e do Estado para com o seu direito à educação.
Por outras palavras, direito à educação é direito a uma Educação de Direito, ou seja, a uma educação conforme ao Direito Internacional da Educação, traduzido na CF/88, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
Com a produção do artigo é possível informar a sociedade sobre o seu direito e como ele deve ser atendido e nesse sentido, a interpretação da Constituição Federal de 1988, da LDB de 1996 e do ECA de 1990 de forma conjunta, onde um ordenamento complementa o outro e não concorre com o outro, representa um grande avanço para a afirmação do direito ao ensino. A partir do momento em que todos tiverem o direito de acesso à educação e o Estado for obrigado a assegurar esse direto a todos, teremos realmente estabelecido o direito a educação na sociedade brasileira.
REFERÊNCIAS
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