RESENHA CRÍTICA: OS ENGENHEIROS DO CAOS
RESENHA CRÍTICA: OS ENGENHEIROS DO CAOS
A NOVA POLÍTICA ESTÁ NA TOCA DO COELHO
Autoria de Lúcio Marcos Granado Júnior, acadêmico do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Goiás e Coordenador de Finanças da Liga Acadêmica de Acessibilidade ao Direito (LAAD).
O livro “Os Engenheiros do Caos: Como as Fake News, as Teorias da Conspiração e os Algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições”, escrito por Giuliano da Empoli, traz uma perspectiva clara e simples sobre o que significa “fazer política” em nossa sociedade contemporânea. Diante de uma leitura rápida, torna-se possível enxergar o quanto a arte da “politicagem” agregou-se a seara de uma terra ainda tão desordeira quanto um bom Western dos tempos antigos.
De início, o autor nos apresenta o Movimento 5 estrelas (5 stelle) que surge na Itália, conduzido pelo comediante Beppe Grillo em meados de 2009, sob o discurso de que a política deveria agora não mais favorecer os partidos mais conhecidos e os políticos mais famosos, e que seria necessário estimular o povo para gerar engajamento através de propagandas infinitas sobre o que é a realidade, e não os velhos discursos e promessas sobre um país das maravilhas e de falsas esperanças aos menos favorecidos, feitos por engomados que jamais experimentariam o sabor amargo de uma crise. Na internet, onde está a raiz desse movimento, encontraram uma maneira de chegar ao povo de uma forma direta e rápida, e por um caminho cada vez mais eficaz: através do caos.
Segundo estudiosos, uma notícia trágica é até 70% mais compartilhada que uma boa notícia. E, com base nesse fato, percebeu-se que é possível contaminar milhares de pessoas com uma propaganda caótica, e, ainda em tempo recorde. Assim, estava claro que o requinte no debate, como na eleição presidencial brasileira de 1989 (Collor x Lula), já não era tão interessante quanto o poder da lacração.
Desse modo, com a mudança inevitável das peças mecânicas da democracia, houve uma também inevitável mudança em sua estrutura, e o que era tido como populismo se tornou um campo de guerra entre fatos e fenômenos, e o pensamento original, aquele que exprime a verdadeira conduta dos agentes políticos, perdeu o que ainda restava de credibilidade diante das pragas chamadas” Fake News “.
Para podermos compreender o sucesso das “Fake News”, é preciso apenas admirarmos a recente invasão dos ratos nos campos do sudeste da Austrália, local onde uma praga de milhões de ratos se espalhou pela região nas últimas semanas, causando sérios danos às plantações e colocando a saúde mental de muitas pessoas em crise. Os ratos encontraram alimentos aos montes, um clima agradável e pouquíssimos predadores, e agora estão se propagando em uma grande velocidade. Com as Fake News acontece a mesma coisa: há um campo verde e limpo, não há leis eficazes para a sua proibição, e há muitas mentes ansiosas que são terras férteis ao seu plantio.
E assim podemos entender o significado do título do livro, “Engenheiros do Caos”, pois a política moderna tornou-se gerida pelos estudiosos da informática e de sistemas, algoritmos e big data, enquanto que os cientistas políticos e sociais “que lutem” por algum espaço. O livro de uma leitura tão direta e informativa é também um passaporte para uma trágica aventura dentro de um portal para uma dimensão ainda inexplicável chamada realidade. Quando nos concentramos em observar o Brasil atual, podemos nos sentir como uma criança que observa um país repleto de loucos, cada um com sua particularidade, e então começamos a entender o que a Alice sentiu ao vislumbrar o País das Maravilhas diante de seus olhos. Como ela, nós estamos perdidos, procurando um caminho, procurando respostas, e até mesmo confiando nossas dúvidas mais cruéis a “pseudos sábios” que conquistam o nosso povo através de palavras vazias, que nos cobram um posicionamento, mas que no fim não apontam a lugar algum. Assim como a Alice, às vezes nos sentimos grandes demais na internet, mas também nos sentimos pequenos demais perante o vazio que tamanha solidão pode nos causar nesse novo normal. Outra semelhança é que o poder de apontar o dedo foi dado a um líder que prefere o grito de “cortem a cabeça!” que utilizar desse atributo para direcionar o nosso país para um caminho de sobriedade. Enquanto isso, cartas tão facilmente substituíveis dedicam suas vidas a defender o soberano e não as suas vidas, mascarando, até mesmo, a verdade dos fatos, ou apenas pintando rosas brancas da cor de carmim para agradar à majestade.
Por fim, a verdade é que mesmo que seja tão importante correr atrás do tempo e da mudança, o que temos é uma mesa de chá composta por pessoas que pararam no tempo, e não são capazes de olhar muito além de suas canecas. É por essas e outras que todos aqueles que decidem entender esse país se transformam em Alice tentando fugir de um país de supostas maravilhas, dentro de um mundo inteiro cheio de fantasias. A grande diferença, afinal, é que à Alice bastou a epifania para que retornasse a sobriedade, enquanto nós não podemos simplesmente acordar de um sonho.
Embora o livro de Giuliano da Empoli não possua uma leitura tão entusiasmante como a do clássico de Lewis Carroll, esse livro pode ser comparado a uma fotografia histórica, um marco, e que dirá muito de nosso tempo, do País das Fantasias em que vivemos, para quando já não pudermos dizer nós mesmos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DA EMPOLI, Giuliano. Os engenheiros do caos : como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. 3. ed. São Paulo: Vestígio, 2019.