Seguridade Social e as Reformas Previdenciárias

Autoria de Pâmela Cristina Silva, Graduanda em Direito e Diretora de Ensino da LAAD.

 

     A princípio, a Declaração Universal dos Direitos Humanos surgiu da necessidade da positivação do direito natural. Diante de tantos acontecimentos drásticos envolvendo atitudes humanas e desastres ambientais o mundo se viu obrigado a levantar os direitos inerentes ao homem de forma positivada. Direitos relativos à vida, à saúde, à educação, à igualdade, à nacionalidade, entre outros, surgiram de forma que influenciasse a edição da legislação dos países componentes da Organização das Nações Unidas.

      No Brasil, a Constituição Federal de 1988, sendo promulgada após a Ditadura Militar, sofreu influências de legislações internacionais e de fatos nacionais, logo trouxe em seu texto direitos presentes na DUDH, sendo considerada a Constituição Cidadã. Entre os fundamentos da República está a Dignidade da Pessoa Humana, o qual é conceituado pelo professor Ingo Wolfgang Sarlet num prisma jurídico:

“Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos”. (SARLET, 2007, p.62)

No prisma da evolução socioeconômica a discrepância na distribuição de renda é perceptível, a qual é essencial para que qualquer ser humano possua condições mínimas existenciais, haja vista as ações do Estado, no sentido de garantidor de direitos, não alcançam de forma eficaz toda a população. Nessa ótica surgiu o chamado seguro social, a fim de garantir a proteção do trabalhador em situações de necessidades, atuando como instrumento de redistribuição de renda.

Dessa forma, faz-se necessário a cooperação entre sociedade e Estado a fim de promover a ordem social. Segundo a CF/1988, seguridade social trata-se do “conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”. Garantindo assim, os mínimos necessários para a sobrevivência com dignidade.

Além disso, no rol dos direitos dos direitos sociais que, segundo Pedro Lenza “apresentam-se como prestações positivas a serem implementadas pela Estado (Social de Direito) e tendem a concretizar a perspectiva de uma isonomia substancial e social na busca de melhores e adequadas condições de vida (…)” (LENZA, 2018, p. 1338) foi incluída a previdência social, a qual é conceituada por José Afonso da Silva como:

“um conjunto de direitos relativos à seguridade social. Como manifestação desta, a previdência tende a ultrapassar a mera concepção de instituição do Estado-providência (Welfare State), sem, no entanto, assumir características socializantes – até porque estas dependem mais do regime econômico do que do social” (SILVA, 2014, p. 187)

Nesse sentido assim aponta Marisa Ferreira dos Santos:

“Deseja a Constituição que todos estejam protegidos, de alguma forma, dentro da seguridade social. E a proteção adequada se fixa em razão do custeio e da necessidade. Assim, se o necessitado for segurado da previdência social, a proteção social será dada pela concessão do benefício previdenciário correspondente à contingência-necessidade que o atingiu.” (SANTOS, 2018, p. 39)

Assim sendo, tendo em vista a cooperação feita entre Estado e Sociedade para a defesa da ordem social, que, segundo Alexandre de Moraes tem como base constitucional “o primado do trabalho, e o objetivo o bem-estar e a justiça social” (MORAES), a população mais pobre sofre com maior impacto as reformas previdenciárias.

O envelhecimento da população no Brasil vem crescendo a cada ano que passa. Para Paulo Tafner, especialista em previdência e economia, a idade média das aposentadorias por tempo de contribuição é de 54 anos, já indivíduos mais pobres, aposentam-se mais frequentemente por idade. Logo, percebe-se que a parcela da população prejudicada no “seguro social”, é a camada mais pobre da população.

Tais reformas vêm ocorrendo a fim de tornar o benefício mais justo e reduzir os custos da Administração Pública. Nessa lógica, os criadores do livro “Previdência em Crise – Diagnóstico e análise econômica do Direito Previdenciário”, Bruno Bianco Leal e Felipe Mêmolo Portela destacam “não há como se garantir um futuro tranquilo sem as necessárias mudanças nas regras previdenciárias brasileiras” (LEAL e PORTELA, 2018).

Desde a promulgação da CF em 1988, a mesma já passou por 6 (seis) Projetos de Emenda Constitucional – PEC’s, acerca da reforma da Previdência. A primeira ocorreu no mandato de Itamar Franco, em 1993 voltada para trabalhadores do setor público. Ao longo destas reformas, direitos dos trabalhadores foram retirados e mais regras foram colocadas.

Falar de seguridade social e previdência é falar de forma atrelada ao Direito do Trabalho e ao Direito Tributário, haja vista, o seguro social surgiu de forma a amparar o trabalhador e é financiado por toda a sociedade de forma direta e indireta, mediante recursos dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; é claro, é também falar sobre garantia de qualidade de vida em um momento de necessidade. Desta forma percebe-se a vastidão da importância do sistema previdenciário e suas normas, e muitos questionamentos podem surgir a respeito das ditas reformas: elas vêm para representar e garantir esses direitos massivamente ou prejudicam uma maioria em face do deleite de uma minoria? As reformas e mudanças garantem um futuro tranquilo ou  retiram essa possibilidade? As classes que realmente necessitam têm encontrado resguardo em tais reformas? A resposta poderá variar, a depender da ótica.

 

 

REFERÊNCIAS

Assembleia Geral da ONU. (1948). “Declaração Universal dos Direitos Humanos” (217 [III] A). Paris.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constiuição Federal de 1988. São Paulo: Saraiva

SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2011.

SAVARIS, José Antonio; SOUZA, Victor Roberto Corrêa. Tutela jurídica dos direitos sociais em formação na PEC da “Nova Previdência”: Uma análise do tratamento conferido às aposentadorias voluntárias. Univali. 2019. Disponível em: < https://siaiap32.univali.br//seer/ >

______________. Direito Processual Previdenciário. 8ª Ed. Curitiba: Alteridade, 2018

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2018

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13ª Edição. São Paulo: Atlas, 2003

BARROSO, Marcelo. Direitos Previdenciários Expectados. Curitiba, Imprenta: 2012.

LEAL, Bruno Bianco; PORTELA, Felipe Mêmolo. Previdência em Crise: diagnóstico e análise econômica do direito previdenciário. São Paulo: Revista dos Tribunais: 2018.

TAFNER, Paulo. Porque a reforma da previdência é necessária. Instituto Millenium, 2018. Disponível em: < https://www.institutomillenium.org.br/por-que-a-reforma-da-previdencia-e-necessaria/ >

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo Brasileiro de 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.

 

 

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